Brasil e Argentina estão com seus mercados domésticos retraídos por causa de problemas em suas economias e vendendo menos carne bovina ao exterior, por motivos diferentes. Mas, nos dois países, os preços da proteína resistem e continuam em patamares elevados. No Brasil, por sinal, alguns cortes ainda não pararam de subir nos supermercados.
No campo, o boi gordo, mesmo diante de uma oferta retraída, começou a acusar o cambaleante consumo doméstico e o enfraquecimento das exportações, motivado pelo embargo chinês à carne bovina brasileira, que ontem completou 45 dias. De 3 de setembro para cá a suspensão voluntária das vendas à China ocorreu no dia 4, depois da confirmação de dois casos atípicos de “vaca louca”, em Minas e em Mato Grosso -, o indicador Cepea/B3 para a arroba caiu cerca de 12%, de pouco mais de R$ 300 para menos de R$ 270.
Já a carne bovina continua salgada no atacado e no varejo. Segundo levantamento da Scot Consultoria baseado em uma média de preços de 22 cortes, no atacado o quilo estava em R$ 31,39 em 1º de setembro, e na semana passada o valor era R$ 32,75. No varejo, no mesmo período, a cotação média da cesta até subiu, de R$ 42,90 para R$ 42,92 o quilo.
Enquanto os consumidores torcem para que a queda do boi torne as carnes mais baratas, Brasília espera um sinal de Pequim sobre o fim do embargo. Mas até agora espera sentada, em meio a muito silêncio e à “falta de agenda” alegada pela China para discutir o tema.
A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, se ofereceu para ir pessoalmente à China tratar da questão, mas ainda não recebeu nenhuma sinalização da Administração Geral de Alfândegas (GACC, na sigla em inglês). A Pasta afirma que tem fornecido “com presteza” as informações solicitadas pelos chineses, e que os técnicos do governo brasileiro também estão disponíveis para esclarecer quaisquer dúvidas.
Apesar de não ser tratada como algo “excepcional”, a participação da ministra é uma estratégia política para tentar destravar as restrições aos embarques de carne bovina mantidas há 45 dias por Pequim. Na diplomacia do agronegócio, essa aproximação ministerial faz parte de um trâmite habitual, ainda mais em uma relação de peso como Brasil e China. Tereza Cristina enviou uma carta ao ministro da GACC.
Na última vez em que o Brasil confirmou um caso atípico do mal da “vaca louca”, em 2019, o embargo dos asiáticos durou 13 dias. Como se trata de uma situação semelhante a anterior, era senso comum que a barreira não duraria muito. Um mês e meio depois, e nada. A Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) já atestou que o rebanho brasileiro não está em risco.
Diante da muralha da China, as exportações de carne bovina não resistiram e começaram a despencar. Nas primeiras semanas de outubro, a queda em relação ao mesmo período do ano passado chegou a quase 40%, segundo dados da Secex analisados pela consultoria Safras & Mercado.
No mês passado, cargas já certificadas e em trânsito para o gigante asiático – e também as vendas por Hong Kong – sustentaram os embarques e os resultados das exportações bateram recorde. A falta de contêineres no mundo fez com que houvesse um atraso nos envios e aumento de estoques dos frigoríficos.
Argentina
Na vizinha e concorrente Argentina, a restrição às exportações adotada pela gestão do presidente Alberto Fernández no fim de maio para forçar a queda dos preços da carne no mercado doméstico também não surtiu grandes efeitos. Primeiro o governo barrou todas as exportações, e em junho os frigoríficos foram autorizados a vender até 50% de sua produção ao exterior. Mais recentemente, foram liberados os embarques à China.
E, lá como cá, os reflexos não apareceram nas gôndolas. Os cortes bovinos intermediários ficaram 1% mais baratos em julho, segundo o Centro de Economia Política Argentina (Cepa). Em agosto houve queda de 1,4% e, em setembro, os preços se estabilizaram.
Fonte: Valor Econômico