Mercado de carne bovina monitora China antes de novo ciclo de preços

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Mais da metade da carne bovina que o Brasil exporta vai para a China. Por isso, o país asiático deve influenciar bastante os preços da pecuária brasileira em 2022, quando o segmento entra em um ciclo de um aumento de oferta. Consultorias divergem tanto sobre o ritmo de recuperação do rebanho de suínos chinês quanto sobre até qual patamar a arroba do boi gordo pode descer. Na previsão mais pessimista, em 12 meses, a cotação pode cair mais de 15% em relação aos recordes registrados em junho. 

Segundo o indicador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), a arroba estava a R$ 312,95 na sextafeira, cotação em linha com as projeções da Agrifatto, Safras & Mercado e Scot Consultoria. Isso significa que os preços no país recuaram quase 3% desde 28 de junho deste ano, quando atingiram a máxima histórica de R$ 321,90, mas estão 37,6% acima do valor registrado no mesmo período do ano passado e 103% acima do patamar de 2019. 

Dois anos atrás, tanto as cotações do boi gordo quanto as do bezerro começaram sua trajetória de forte valorização. À época, além de a disponibilidade de animais de reposição estar bastante reduzida, a China havia entrado no mercado com um apetite voraz por proteínas que pudessem substituir a produção local de carne suína, reduzida após o país ser obrigado a abater praticamente metade de seu rebanho por causa de um surto de peste suína africana. 

De acordo com dados da Scot Consultoria, o preço do bezerro anelorado subiu 120% desde julho de 2019, saindo de R$ 1.320 para R$ 2.900. Nesse mesmo intervalo, a arroba do boi gordo mais do que dobrou, saindo de R$ 154 para os R$ 312 da última segunda-feira.

Agora, ao mesmo tempo que o rebanho de suínos chinês está em franca recuperação e o país caminha para retomar, em 2022, os níveis de produção pré-peste suína africana, a oferta brasileira de bezerros, garrotes e bois magros tende a aumentar, já que os pecuaristas começaram a reter fêmeas no fim de 2019, de olho no cenário favorável que se desenhava para os animais de reposição. 

Com isso, na visão do analista Fernando Iglesias, da Safras & Mercado, as cotações podem chegar a valores entre R$ 270 e R$ 280 em São Paulo no auge da disponibilidade de gado criado a pasto, que acontecerá entre maio e junho. Em uma projeção um pouco mais comedida, Rodrigo Queiroz, da Scot Consultoria, projeta a arroba perto, mas ainda acima, de R$ 300. Lygia Pimentel, diretora da Agrifatto, por sua vez, estima valores reais (ajustados pela inflação) no segundo semestre de 2022 entre 5% e 7% menores do que os atuais. 

O analista da Scot lembra, ainda, que a estratégia de reter fêmeas também provoca, no curtíssimo prazo, uma queda na oferta, já que são menos animais indo para o gancho. Assim, a disponibilidade de animais pode demorar um pouco mais para alcançar o ritmo de abates. Iglesias concorda e explica: “Não é como uma fábrica, em que se aperta um botão e se expande a produção. É uma atividade de ciclo longo. Demora para que o movimento seja traduzido em aumento de rebanho e ritmo de abate”. 

Porém, o consultor da Safras afirma que a dependência que o Brasil tem da China, para onde vão direta ou indiretamente metade das exportações de carne bovina nacionais, dá condições para a queda acentuada projetada pela empresa, uma vez que o mercado interno não se mostra em condições de absorver a proteína nos patamares atuais. 

A Agrifatto analisa a possibilidade de os abates na China não serem um reflexo direto da recuperação do rebanho, mas também de uma estratégia de mercado dos produtores, em meio ao receio de uma nova onda de peste suína africana no país. “Discute-se a possibilidade de que os pecuaristas estejam com medo de perder seus contingentes e por isso estão entregando aos frigoríficos mesmo que seja para ganhar menos”, diz ela.

Assim como ocorreu na carne bovina, os preços do milho e do farelo soja, usados na composição de rações, subiram fortemente nos últimos anos. Mas, diferentemente do que ocorre na pecuária, não há tendência de queda das cotações nos próximos meses. O Brasil enfrentou problemas climáticos duas safras seguidas, o que limitou parte do potencial produtivo. Com isso, a oferta desses produtos está bastante ajustada à demanda e deve apertar as margens operacionais dos pecuaristas no ano que vem.

“A safra de verão não será ampla em milho porque a área de soja vai crescer muito. Então, só teremos uma quantidade maior do cereal entrando na safrinha de 2022. Será um ano bastante complicado em termos de abastecimento até a normalização, em julho de 2022”, diz Iglesias. “Ainda é cedo para avaliar o tamanho da segunda safra do ano que vem”. 

Nos próximos meses, a indústria de rações também terá que disputar grão a grão com a China, que tem a remuneração em dólar a seu favor. Conforme o plantel de suínos do país asiático se recupera, agora com um perfil mais tecnificado, a Safras vê um aumento na demanda por grãos, incluindo o do Brasil. Iglesias afirma que os chineses só não conseguiram comprar volumes expressivos de milho da safrinha atual por causa da quebra. 

Queiroz acrescenta que a seca também afetou a qualidade das pastagens e forçou pecuaristas a diminuírem a taxa de lotação, o que também dificulta o manejo de gado a pasto. Com rações mais caras e o arroba em queda, é possível que pecuaristas diminuam o volume de animais confinados no ano que vem. 

O analista da Safras defende que o pecuarista precisa se planejar e utilizar soluções como hedge para se proteger de oscilações no mercado. “Não utilizar esses mecanismos disponíveis no mercado brasileiro é o mesmo que ter uma Ferrari e não fazer seguro”, compara. Lygia Pimentel reforça que a volatilidade vista hoje na pecuária requer gestão de risco eficiente e informação bem trabalhada.

Fonte: Valor Econômico

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