Lei que permite o ‘boi bombeiro’ é comemorada por entidades rurais de MT

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A sanção da Lei nº 12.653/2024 do Estado de Mato Grosso, que permite o uso da pecuária extensiva e a prática de roçada visando a redução de biomassa vegetal combustível e os riscos de incêndios florestais, está sendo comemorada pelo setor agropecuário. Além disso, tem mobilizado entidades da área para levar informações aos produtores rurais e técnicos que atuam nas propriedades.

Em nota divulgada na última terça-feira (24/9), a Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato) diz que a nova normativa “representa uma vitória significativa para o setor produtivo rural”. A nova legislação altera a Lei nº 8.830/2008 – que dispõe sobre a Política Estadual de Gestão e Proteção à Bacia do Alto Paraguai no Estado de Mato Grosso – e inclui a figura do “boi bombeiro” em áreas de preservação permanente (APP).

A ideia do “boi bombeiro”, criada originalmente por Arnildo Pott, pesquisador e professor aposentado da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), é que os bovinos fazem um papel de limpeza, mantendo a pastagem baixa, evitando que o fogo se desenvolva com rapidez e seja fácil para se controlar.

O objetivo é auxiliar no combate aos incêndios no Pantanal, um dos biomas mais atingidos pelas queimadas. O Bioma Pantanal, localizado no Sul do Estado, corresponde a 7% da área do Mato Grosso, totalizando 60.885 km².

A advogada Tatiana Monteiro Costa e Silva, consultora ambiental da Famato, detalha que os produtores aguardavam essa decisão – fruto de acordo judicial -, que acabou trazendo algumas situações novas. Por isso, a Famato e entidades ligadas ao Pantanal e aos produtores rurais que atuam no bioma, como os sindicatos rurais, estão trabalhando para levar informações por meio de reuniões e debates para discutir os parâmetros da nova legislação.

A capacitação de profissionais e técnicos que atuam nas propriedades também é foco das entidades. “É um momento de transição para esse novo complexo legislativo, que exige informação e entendimento sobre a aplicabilidade da lei”, considera Tatiana. Também está no escopo da Famato monitorar as análises da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) frente à novidade.

Entenda a lei

A Lei 12.653 é resultado de acordo judicial firmado com o Ministério Público do Estado de Mato Grosso (MPE) e outras entidades, referente à Ação Direta de Inconstitucionalidade Material contra a Lei 11.861 de 2022, que permite a pecuária extensiva – quando o gado vive solto no pasto e exige maiores quantidades de terra – no Pantanal sem determinar limites para sua implantação. Entre as partes envolvidas na ação estão a Famato, o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), o Estado de Mato Grosso, a Sema, a Procuradoria Geral do Estado, além de outras entidades ligadas aos setores agropecuário e ambiental.

A nova legislação está sendo considerada pelo governo do Mato Grosso um aprimoramento da Lei do Pantanal, de 2008. Em nota, a Sema informa que “essa nova lei traz uma proibição ainda mais rigorosa para a proteção do bioma, prevendo não apenas restrições para a plantação, mas também para a pecuária, barragens e funcionamento de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs)”.

A Sema também enfatiza que a nova lei permite a pecuária extensiva e roçadas apenas em áreas de preservação permanente que possuam pastagens nativas. “Não é uma liberação irrestrita para criar gado no Pantanal, mas sim para que a atividade pecuária crie aceiros naturais, ajudando a reduzir a propagação dos incêndios”, afirma o órgão estadual.

A permissão sustentável da pecuária no local, segundo a secretaria, é fundamentada em mais de 50 anos de estudos da Embrapa Pantanal. “A lei traz restrições claras, de modo que a atividade promova o desenvolvimento sustentável, econômico e social da região”, aponta.

Críticas

Por outro lado, a tese é rejeitada por alguns especialistas e ambientalistas. Um levantamento de 2020 do professor Ubirajara Oliveira, do Centro de Sensoriamento Remoto da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mostrou que nos municípios onde há mais cabeças de gado no Pantanal é onde estão concentrados o maior número de focos de incêndios.

Para o biólogo Gustavo Figueroa, diretor do Instituto SOS Pantanal, existe um fundo de verdade nessa tese, mas sua eficácia é relativa. “O boi, em algumas ocasiões e em alguns locais, vai diminuir a matéria orgânica, mas não dá pra imaginar que colocando boi por todos os lugares vai diminuir os incêndios, tanto que várias fazendas que têm atividade pecuária pegaram fogo também”, analisou.

O Observatório Ambiental do Mato Grosso informou à Globo Rural que está avaliando a nova legislação para poder comentar seu posicionamento.

A Famato enfatiza que é fundamental especificar que o uso previsto na nova normativa se limita apenas ao ‘acesso’ do gado à área de APP para a utilização de água. “Essa disposição visa garantir que os pecuaristas possam acessar um recurso vital para a manutenção e dessedentação de seus rebanhos, sem comprometer os princípios de preservação ambiental comumente associados a essas áreas”, salienta a entidade.

Além disso, a federação reforça que a realização de roçadas na APP foi autorizada exclusivamente para prevenir incêndios, “uma medida que busca proteger a biodiversidade local, ou que deve ser compreendida de maneira clara por todos os envolvidos”.

A Famato expressa sua preocupação com possíveis interpretações equivocadas da nova legislação, as quais podem encorajar comportamentos ilegais e práticas que vão contra os objetivos de proteção e conservação do Pantanal. “A integração entre produção rural e conservação ambiental deve ser pautada pelo respeito às leis vigentes e pela adoção de boas práticas agropecuárias”, alerta.

Para a advogada Tatiana, a nova legislação deixa o sistema normativo do Pantanal mais robusto e seguro. “Assim, será possível um controle maior por parte do poder público e da sociedade”, ressalta. Ela lembra que o Cadastro Ambiental Rural (CAR) é um dos instrumentos para a fiscalização do produtor. “Aqueles que saírem da conduta legal, sem dúvida, serão penalizados”, frisa. No entanto, ela pondera que, no Estado, grande parte dos produtores rurais busca informações e age de acordo com a legislação.

Avanço

A promotora do MPMT Ana Luiza Perperline, que atuou na ação de inconstitucionalidade, explicou à Agência Brasil que a nova legislação é um avanço por retirar a possibilidade do uso de APPs para pecuária extensiva. A norma anterior permitia o uso e o acesso do gado a essas áreas de proteção, enquanto a nova lei permite apenas o acesso. Ou seja, o gado não pode ficar nas pastagens nativas por tempo indeterminado.

Para a promotora, as mudanças na lei sanaram as inconstitucionalidades apontadas pelo Ministério Público. “A lei anterior permitia, de certa forma, usar a reserva legal com atividades que não eram permitidas pela legislação, a não ser mediante manejo florestal sustentável”, completou.

Fonte: Globo Rural

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