OS pesquisadores abordam o comportamento das exportações de carne bovina e as perspectivas futuras de mercado
Nesta edição do Boletim CiCarne, os pesquisadores abordam o comportamento das exportações de carne bovina e as perspectivas futuras de mercado. Apesar da queda no valor das exportações de carne bovina no início de 2023, é notável a contínua expansão da demanda internacional que impulsiona o volume de produtos embarcados para outros países.
Apesar da queda no valor das exportações de carne bovina no início de 2023, é notável a contínua expansão da demanda internacional que impulsiona o volume de produtos embarcados para outros países. A indústria brasileira de carne bovina tem vivido um cenário promissor nos últimos anos, com inúmeras oportunidades para expandir suas exportações. A demanda global por alimentos, aliada à queda nos preços domésticos e ao aumento dos preços internacionais, tem impulsionado a busca por mercados estrangeiros. Nesse contexto, o Brasil destaca-se como o maior exportador da carne mais demandada no mundo, conhecida como “carne ingrediente”, que será posteriormente industrializada no país de destino.
Uma oportunidade significativa surge com o aumento da demanda da China, que busca reduzir sua dependência dos Estados Unidos. Além disso, a epidemia da gripe suína africana continua a impulsionar a procura pela nossa carne. Essa doença destruiu mais de 40% da população suína da China, abrindo espaço para outras carnes. Há inclusive quem defenda que a carne bovina ganhou espaço no hábito alimentar dos chineses, ou seja, mesmo depois do final do efeito da menor oferta de carne suína, sua demanda será reduzida em favor da carne bovina.
Vale ressaltar que em junho o MAPA conseguiu a liberação do estoque de carne bovina produzida antes da suspensão de fevereiro, após a confirmação de um caso atípico de doença da “vaca louca”. São aproximadamente 40 mil toneladas que poderão ser comercializadas para a China. Durante o embargo, o governo brasileiro recebeu uma carta do órgão de alfândega sanitária do governo Chinês que, além de visitar o país e fazer novas habilitações, reconheceu o sistema de defesa brasileiro e ressaltou sua transparência e a agilidade de suas operações. Conforme o Ministro Carlos Fávaro, isso dá segurança aos compradores e abre a possibilidade de discussão sobre a revisão do protocolo de embargo em novos casos de vaca louca. A China é, atualmente, o principal mercado para a carne brasileira e apresenta grande potencial de crescimento, pois seu consumo per capita ainda é baixo, na faixa de 4 kg/hab/ano. A China depende de importações que chegam a 30% de seu consumo doméstico, sendo o maior importador mundial dessa proteína.
Outra questão relevante é que, após uma espera de 20 anos, o mercado mexicano foi aberto para o Brasil. O México é o terceiro maior importador mundial de proteína animal, atrás apenas da China e do Japão. Essa abertura possibilita acesso ao mercado da América do Norte (EUA, México e Canadá), que contempla algo em torno de 500 milhões de habitantes. A expectativa é que isso gere um aumento significativo nas exportações, de modo a proporcionar um impulso econômico.
O governo da Indonésia aumentou de 20 mil para 100 mil toneladas a cota anual de importações de carne bovina brasileira. Em 2019, quando esse país abriu seu mercado, os frigoríficos nacionais exportaram 3,5 mil toneladas. Isso mostra o aumento expressivo ocorrido nos últimos 5 anos. As importações totais da Indonésia estão em torno de 230 mil toneladas de carne bovina por ano, sendo que o principal fornecedor é a Austrália, um dos principais concorrentes brasileiros. Atualmente, o maior país muçulmano é a Indonésia e uma das exigências para importação é que os produtos sejam provenientes de abatedouros com certificado halal.
Halal é uma palavra em árabe que significa o que é permitido, lícito, autorizado e dentro da lei. A regra deve ser seguida à risca pela lei islâmica, que rege os costumes dos muçulmanos. Atualmente a população muçulmana está em torno de 1,8 bilhão de pessoas e a expectativa é de que ela seja um terço da população mundial nos próximos 10 anos. O Brasil tem grande potencial para exportação da carne bovina halal e o número de certificações está crescendo significativamente de acordo com dados da CDIAL Halal, uma das certificadoras da América Latina acreditada pelos principais órgãos oficiais. Esta certificação é aceita em todo o mundo, inclusive nos países de maior população muçulmana como Malásia, Indonésia, Singapura e Golfo Pérsico (ou Golfo Árabe).
Embora as exportações de carne bovina tenham aumentado, em comparação com os padrões internacionais, há espaço para conquistas de novos mercados e expansão nos atuais que o Brasil poderá atender. É inegável o avanço alcançado nos últimos anos devido às pesquisas desenvolvidas em universidades, iniciativa privada e instituições de pesquisa, como a Embrapa. Esse avanço só foi possível graças ao grande esforço feito pelos pecuaristas brasileiros em adotá-las em suas propriedades, mas ainda existe uma boa margem para melhorias na produtividade da pecuária de corte.
Algo recente no campo da inovação que pode ser destacado é que o Brasil tem se tornado um hub regional para start-ups de agtech, empresas que aplicam tecnologia avançada e inovação no setor agrícola, oferecendo oportunidades para melhorias na cadeia produtiva. Atualmente, existem 1.703 start-ups de agtech no país, o que demonstra o potencial de inovação e modernização do setor. As agtechs têm uma ampla gama de atuação na produção de carne bovina, com soluções tecnológicas inovadoras aplicadas em áreas como monitoramento e rastreamento, nutrição, melhoramento genético, manejo, saúde, qualidade da carne e bem-estar animal, além de análise de dados e gestão. Aqui é importante que o gargalo da baixa conectividade, especialmente nas áreas rurais, seja enfrentado potencializando os impactos que a tecnologia da informação pode trazer ao setor.
Iniciativas recentes do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) têm muito a contribuir para a abertura de mercados para a carne bovina brasileira e promoção da imagem do Brasil no exterior. A mais recente trata de uma missão oficial, que contou com a participação da Embrapa, na qual o Ministro Carlos Fávaro apresentou um projeto para recuperação e conversão de até 40 milhões de hectares de pastagens que tem potencial de aumentar significativamente a área de produção de alimentos do Brasil sem necessidade de novas áreas. Esse projeto prevê investimentos de aproximadamente U$ 120 bilhões em 10 anos e investidores internacionais poderão aderir ao programa o financiando.
Essa comitiva visitou autoridades e investidores da Coreia do Sul, Japão, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita. Vale ressaltar que esses países têm grande potencial de importação de carne bovina, sendo que estão entre os que pagam preços mais altos por esse produto no mercado internacional. No Boletim CiCarne número 24, de setembro de 2020 (de título: “Brasil recebe de 27 a 41% a menos pela carne bovina exportada do que concorrentes”) foi mencionado que um dos motivos para o Brasil exportar sua carne com valor inferior ao de países como Estados Unidos e Austrália era o fato de esses países terem como importadores mercados mais exigentes como Japão e Coreia do Sul, que remuneram melhor seus fornecedores. Portanto, considera-se que essas visitas são um passo importante para a diminuição dessa diferença de preços no médio e longo prazo, desde que consigamos atender à exigência desses mercados.
Nessa cadeia produtiva também são visualizados riscos que podem ser transformados em oportunidades, como questões que envolvem a segurança do alimento, tais como surtos de doenças como febre aftosa ou encefalopatia espongiforme bovina (vaca louca), as quais podem prejudicar significativamente as perspectivas de exportação do Brasil. Portanto, manter um sistema de defesa robusto e garantir a transparência e agilidade das operações para manter a confiança dos compradores internacionais traduzse como uma oportunidade a ser explorada, que pode ter um impacto de manter e aumentar a demanda de carne bovina no mercado interno e nos principais mercados de exportação nos próximos anos.
Outro aspecto de grande impacto está relacionado à rastreabilidade da cadeia de suprimentos e implementação de padrões governamentais no setor, os quais são essenciais para fortalecer a transparência e reduzir os riscos de adquirir carne bovina de áreas com problemas ambientais e sociais. Iniciativas como essa estão cada vez mais presentes na agenda de empresas e órgãos governamentais que atuam nessa relevante cadeia produtiva. Muito importante que seja um esforço de toda a cadeia produtiva, repartindo justamente as responsabilidades de cada um e com esforços conjuntos e coordenados garantir uma produção que minimize os impactos negativos da atividade.
O Brasil possui oportunidades significativas para expandir suas exportações de carne bovina. A demanda internacional crescente, o aumento da renda global e a busca por novos mercados são fatores promissores. No entanto, desafios relacionados à produtividade, à segurança do alimento, à sanidade animal e à sustentabilidade devem ser enfrentados para garantir a viabilidade e a competitividade do setor. Com investimentos em inovação e aprimoramento da cadeia de suprimentos, o Brasil pode não só consolidar sua posição como um dos principais exportadores de carne bovina do mundo, mas ser um exemplo a ser seguido.
Fonte: Embrapa