A contratação de crédito rural ultrapassou a marca de R$ 209,6 bilhões de julho de 2021 a março de 2022, valor 25% superior ao contratado no mesmo período da temporada anterior (R$ 167 bilhões). Com a alta de custos no campo, o produtor busca volumes maiores de recursos, mas tem encontrado juros mais elevados e dificuldades adicionais com a suspensão das linhas equalizadas do Plano Safra 2021/22, que perdura desde fevereiro por falta de orçamento do Tesouro Nacional.
Com isso, o ritmo de contratação em março voltou a ser bem menor que o observado no mesmo mês de 2021. Os desembolsos de crédito rural chegaram a R$ 15,7 bilhões no mês; um ano antes, eles haviam somado R$ 21,7 bilhões.
E a sequência da safra e as condições para a próxima estão comprometidas. O governo ainda não conseguiu destravar o plano em vigor, que está com quase todas as linhas equalizadas suspensas desde 7 de fevereiro, e para isso depende da votação do PLN 1/2022, que continua sem data marcada. São mais de R$ 24 bilhões em linhas de custeio e investimentos parados nos bancos por conta do esgotamento precoce do caixa da subvenção.
O setor reclama das justificativas de Brasília para a falta de orçamento para o Plano Safra, já que a arrecadação federal cresceu. Sem pré-custeio, produtores alertam para a alta dos custos de produção e esperam “reconhecimento” do governo, ainda mais em um ano eleitoral.
“A perspectiva é complicada. Está faltando recurso para agora. Que garantia nós temos de que o novo Plano Safra dure até dezembro, por exemplo, que é o último mês do orçamento?”, disse Antônio da Luz, economista-chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul). “Não dá para dizer que o cobertor é menor. Tudo é uma questão de prioridade, e a produção de alimentos deve ser a prioridade número um”, afirmou Glauber Silveira, diretor-executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho).
A conta para a safra 2022/23 pode ser muito alta e vai exigir um grande esforço político do novo ministro da Agricultura, Marcos Montes, e da bancada ruralista. O Valor apurou que, para manter as mesmas taxas de juros atuais, seriam necessários R$ 19 bilhões para equalização, algo avaliado como muito improvável de acontecer.
“É inevitável uma alta de juros, mas vamos fazer isso com cuidado. Os custos de produção aumentaram, mas a margem absoluta cresceu também”, disse o subsecretário de Política Agrícola e Negócios Agroambientais do Ministério da Economia, Rogério Boueri.
A elaboração do Plano Safra 2022/23 ainda não chegou à fase de definição de valores e condições. “Não tem a conta das exigibilidades e não temos a conta de quanto vamos poder gastar”, disse. Isso por causa de um déficit de R$ 819 milhões no orçamento da equalização para o segundo semestre deste ano. Será necessário um aporte extra, mas a área técnica do governo ainda não encontrou espaço para isso.
“As nossas prioridades são reabrir o Plano Safra atual para o Pronaf Investimentos, e depois, para as demais linhas, ter recursos para a safra 2022/23. O restante entrará na fila. Os primeiros recursos que entrarem vão pra isso e não tem conversa”, afirmou Boueri, o que pode dificultar os reforços milionários que o setor quer para o seguro rural. “Esses R$ 819 milhões vão pautar de quanto será o Plano Safra todo”, disse.
A Economia quer antever movimentos que não foram percebidos na elaboração deste plano, como a escalada da Selic, e se precaver de eventuais déficits no orçamento. “Se tivéssemos olhado para a frente, teríamos visto que a taxa iria aumentar. Então agora vamos tentar olhar para a frente, para o que achamos que vai acontecer”, disse Boueri.
Com a alta dos juros desde o ano passado, os R$ 13 bilhões previstos para a equalização do Plano Safra 2021/22 se esgotaram mais cedo que o previsto e tiveram que ser reforçados. Foram remanejados R$ 791,5 milhões para reabrir as linhas equalizadas de custeio do Pronaf, as únicas com subvenção em operação, e o governo pediu autorização do Congresso para suplementar mais R$ 868,5 milhões via PLN 1. Se entrar na conta o valor de R$ 1,2 bilhão para o pagamento de rebates de até 35,2% das parcelas de produtores atingidos pela seca no Sul este ano, o orçamento vai para R$ 15,8 bilhões.
A avaliação de João Luiz Guadagnin, consultor sênior em crédito rural, é que grandes produtores ainda terão subvenção, mas apenas para investimentos. A tendência é que o governo concentre a maior parte do orçamento da equalização no apoio aos pequenos e médios produtores.
O cenário favorece o crédito privado. “Os recursos livres e do mercado de capitais já serão maiores que os recursos controlados em 2022. O que vai faltar é recurso com juro controlado”, disse Antônio da Luz. Agora, são R$ 165,2 bilhões em recursos controlados, com e sem subvenção.
O diretor de Agronegócios do Santander, Carlos Aguiar Neto, diz que os bancos vão suprir o agro com recursos livres, mas juros altos. “Não haverá taxa de crédito livre abaixo de 15%, pois o custo deverá ser de, no mínimo, 13%, dada a alta da Selic”.
Fonte: Valor Econômico