O desafio central para o acesso do agronegócio à tecnologia 5G não está precisamente na conectividade ou no desenvolvimento de novas plataformas e aplicativos, que, na prática, já estão em uso ou a caminho. “Será essencial desenvolver uma cultura digital dentro das organizações do setor”, pondera Abdalah Novaes, líder de negócios da Climate FieldView para a América Latina.
As tecnologias associadas ao 5G vão de fato agregar maior capacidade de banda, aumentar a velocidade de transmissão e de tratamento de dados e imagens, reduzir a latência (ou seja, o tempo de resposta de todo o sistema), trazendo soluções mais inteligentes e mais baratas para a tomada de decisões em tempo real, comenta Novaes. “Mas não são mais fáceis de utilizar”, acrescenta.
Como parte da iniciativa ConectarAgro, associação criada por fabricantes de máquinas e equipamentos agrícolas, operadoras de telefonia e provedores de soluções tecnológicas para o campo, além da própria Climate, foi possível incluir 5 milhões de hectares na rede 4G em 2020, primeiro ano do projeto. Mais 13 milhões de hectares em áreas novas deverão ser conectadas até o final deste ano.
Desde o ano passado, a Climate testa, no Brasil e na Argentina, o manejo de ervas daninhas com uso de drones, que identificam pragas por meio de imagens de altíssima resolução e algoritmos baseados em inteligência artificial. Depois de tratadas, as informações ajudarão a montar mapas vegetativos digitais que serão transmitidos a pulverizadores, permitindo a aplicação racional de defensivos.
A primeira rede móvel em tecnologia 5G no país foi instalada em Rio Verde (GO), em dezembro de 2020, em caráter experimental, interligando a Fazenda Nycolle ao Parque Tecnológico do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano (IF Goiano) e ao Centro de Excelência em Agricultura Exponencial (Ceagre), inaugurados no mesmo período. O projeto, uma parceria entre governo do Estado, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg), Centro de Excelência em Inteligência Artificial da Universidade Federal de Goiás (Ceia/UFG), IF Goiano, Claro e Huawei resultou, de início, no desenvolvimento de drones e veículos autônomos para o manejo de pragas na fazenda, segundo o secretário-geral de governo de Goiás, Adriano Rocha Lima.
Enquanto o drone identifica ervas invasoras, descreve ele, os veículos inteligentes operam no solo para detectar pragas que atacam a parte rasteira das plantas. Há seis meses, os testes entraram em sua segunda etapa, agora para o desenvolvimento de drones capazes de fazer a pulverização diretamente nos focos de infestação.
Soluções já no mercado deverão ser sensivelmente potencializadas pela chegada do 5G, afirma Zaima Milazzo, presidente do Brasil, o Instituto de Ciência e Tecnologia (ICT) da Algar Telecom. O instituto adota um sistema de inovação aberta e de parcerias estratégicas para desenvolver soluções disruptivas, especialmente no agronegócio, envolvendo internet das coisas, computação em nuvem e outras plataformas para o 5G. Zaima destaca o escritório móvel, um trailer desenvolvido pela startup Prime Field, incubada na Faculdades Associadas de Uberaba (Fazu). O escritório consolida e processa informações coletadas no campo por meio de sensores ligados a uma rede sem fio para depois enviá-las para a nuvem.
O aplicativo K1Agro, desenvolvido pelo Brain em parceria com a BankSystem, com sede no Porto Digital de Recife, detalha Zaima, assemelha-se a um carrinho de picolé, equipado com antena de 12 metros, com uma câmera térmica de alta precisão no topo. O sistema tem aplicação na prevenção de incêndios e na segurança de propriedades rurais porque consegue identificar mudanças de temperatura e de coloração das plantas e detecta invasões de perímetro.
Até 2030, segundo o estudo 5G Business Potential, realizado pela Ericsson, o processo de digitalização do agronegócio tende a gerar receitas adicionais de R$ 49 bilhões para a área de tecnologia da informação e comunicação, dos quais R$ 10 bilhões estarão relacionados ao 5G, detalha Murilo Barbosa, vice-presidente de Negócios Regionais da Ericsson para o Cone Sul da América Latina. A multinacional sueca é uma das parceiras da São Martinho, juntamente com a Vivo, no projeto 5G Smart Farming, lançado em novembro do ano passado com o objetivo de desenvolver soluções em 4G e 5G para a principal usina do grupo, instalada em Pradópolis (SP). Inicialmente, foram relacionadas 24 aplicações com potencial para desenvolvimento em 5G.
A primeira delas, já testada na Usina São Martinho, conecta drones fabricados pela brasileira XMobots para mapeamento de alta precisão dos canaviais, investigando falhas nas linhas de plantio, ervas daninhas e pragas. As imagens de alta qualidade são transmitidas em tempo real para a central de operações agrícolas da usina, onde são tratadas utilizando recursos tecnológicos em 5G.
Além de fornecer a solução de conectividade para o experimento com o drone, aponta Diego Aguiar, head de IoT, Big Data e Inovação B2B da Vivo Empresas, a operadora entrou com sua expertise nessas mesmas áreas e busca “apoiar o desenvolvimento de soluções que aumentem a eficiência dos processos agroindustriais e promovam melhor utilização dos recursos da empresa, com a digitalização de todas as operações da unidade de Pradópolis”, em um processo que deverá ser levado às demais plantas da São Martinho.
Fonte: Valor Econômico