Migração para o sistema de plantio direto (SPD) de alta qualidade, expansão da adoção de sistemas integrados e utilização da tecnologia de fixação biológica de nitrogênio (FBN) são fundamentais para que a produção de soja continue a avançar no Brasil sem aumento e até com redução das emissões de gases de efeito estufa.
Obrigatória em um número cada vez maior de propriedades nos últimos anos, a receita é destacada pelo estudo “Potencial de Mitigação de Gases de Efeito Estufa das Ações de Descarbonização da Produção de Soja até 2030”, concluído recentemente pelo Observatório de Bioeconomia da Fundação Getulio Vargas (FGV). E ganha força à medida que aumenta a pressão interna e externa por práticas sustentáveis no campo.
O trabalho realça que o agronegócio, responsável por 27% do PIB, 20% dos empregos e 48% das exportações, colabora com 28% das emissões totais de gases de efeito estufa (GEE) no país, segundo dados do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG). Mas reforça que a soja, carro-chefe do campo brasileiro, é uma cultura de baixo carbono, já que emite “apenas” 9 milhões de toneladas de CO2 equivalente ao ano.
Essas emissões são divididas em quatro categorias: insumos (aplicação de calcário), decomposição de resíduos da lavoura, operações mecanizadas e remoções de carbono. Cada uma emite um ou diversos gases de efeito estufa. Como a tendência é o plantio de soja continuar a avançar, o trabalho reitera a importância de que boas práticas sejam aprofundadas, sob o risco de termos pela frente aumento de emissões.
Grande potencial
“Entretanto, ha grande potencial para que a cultura se torne não só ‘carbono neutro’, como também um sumidouro de carbono, potencializando sua participação em um futuro mercado de carbono em que o Brasil estaria inserido”, escrevem Camila Genaro Estevam, Cicero Zanetti de Lima, Eduardo de Morais Pavão, Eduardo Delgado Assad e Talita Priscila Pinto, autores do estudo da FGV.
Nos cenários que traçaram, os pesquisadores levaram em conta que a área semeada com soja crescerá 27,2% até 2030 em relação a 2020 e alcançará 47,3 milhões de hectares. Por causa de ganhos de produtividade, a colheita chegaria a 176,4 milhões de toneladas até o fim da década, 44,9% mais que no início.
Nos cenários alternativos, caso ocorra a migração de soja “soleira” para o sistema de Integração Lavoura-Floresta (ILF) – de 10%, 20% ou 30% da área total por ano, com eucalipto como componente florestal , mais tecnologia FBN, que já é bastante disseminada em razão do uso de sementes inoculadas, e aceleração dos SPD potencializaram a sustentabilidade da produção.
Conforme o estudo, as emissões geradas pelo uso de insumos e pela decomposição de resíduos poderão representar 405,7 milhões e 109,2 milhões de toneladas de CO2 equivalente em 2030, respectivamente. No caso das operações mecanizadas, os cálculos apontam para apenas 6,3 milhões de toneladas. Já as remoções de GEE oriundas de plantio direto (baixa qualidade) e SPD (alta qualidade) podem chegar a 431,2 milhões de toneladas de CO2 equivalente no mesmo horizonte.
É importante ressaltar que o SPD (alta qualidade) tem potencial de remover 1,83 toneladas de CO2 equivalente para cada hectare plantado, já o plantio direto (baixa qualidade) remove a metade 0,92.
Nessa equação, portanto, o saldo final das emissões da produção de soja é positivo em 90 milhões de toneladas de CO2 equivalente. “Mas o sinal do balanço das emissões do sistema poderia se inverter caso houvesse uma aceleração da adoção do SPD em diferentes regiões do país, passando de uma “soja baixo carbono” para uma produção carbono neutro já em 2030”, diz o estudo.
Integração lavoura pecuária
Outro sistema com grande potencial de remoção de GEE é o ILF. Se adotado em 20% da área cultivada no país até 2030, o potencial de mitigação proporcionado por ele chega a 899,8 milhões de toneladas de CO2 equivalente, ou dez vezes o balanço positivo das emissões da soja. “Com o ILF, para cada 1 milhão de toneladas de CO2 equivalente emitidas pela soja, 10 milhões são mitigados”.
Os pesquisadores observam, ainda, que nesse caminho não pode haver desmatamento. Na Amazônia, um hectare desmatado emite 406 toneladas de CO2 equivalente; no Cerrado, a média é 281 toneladas.
Fonte: Valor Econômico