A recuperação de pastagens que os próprios produtores consideram como degradadas pode ampliar o rebanho bovino brasileiro em ao menos 4,9%. A ação é crucial para impedir que a produção rural resulte em desmatamento, e poderia ocorrer apenas com a adoção de técnicas já aplicadas em cada regiões e ainda reservando áreas para adequação ambiental. Mas o aumento do rebanho pode ser até maior. Ele chegaria a 9,7% se todos os pastos “degradados” tiverem aumento de lotação de animais.
Essas conclusões são de um estudo realizado por pesquisadores do World Resources Institute (WRI) Brasil e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) que será publicado hoje na revista “Royal Society Open Science”. Para os cálculos do estudo, os pesquisadores utilizaram os dados do último Censo Agropecuário, de 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No censo, são os proprietários que declaram as informações sobre área e rebanhos e que classificam se seus pastos são “degradados”.
No último censo, os proprietários reportaram ao IBGE um total de 12 milhões de hectares de pastos “degradados” – número bem menor que outros cálculos feitos com apoio de satélites, que indicam uma extensão mais próxima de 100 milhões de hectares.
Mesmo se considerada uma área menor, a recuperação dos pastos teria aumento significativo na oferta de gado no país em diferentes cenários econométricos. E seria um processo mais “fácil”, já que o próprio dono “reconhece a recuperação como necessidade”, diz Rafael Barbieri, do WRI Brasil.
Em um cenário, os pesquisadores calcularam que os pecuaristas teriam que reservar pastos “nativos” – de vegetação natural rasteira, como nos Pampas ou no Cerrado, mas ocupados com pastoreio – e parte dos pastos degradados para recuperar o déficit de vegetação nas propriedades, calculada em alguns estudos em 12,7 milhões de hectares. Ainda assim, haveria mais 5 milhões de hectares de pastos para serem recuperados. A intensificação adicionaria 9,1 milhões de cabeças ao rebanho.
Em um segundo cenário, que desconsidera que os produtores convertam pastos para recompor vegetações e apostem apenas na intensificação, de 10 milhões de hectares poderiam ter aumento de lotação de animais, resultando em uma oferta adicional de 17,7 milhões de cabeças.
Diferentemente de outros estudos, o aumento da lotação foi calculado não com base no limite da capacidade física das terras, mas no padrão de criação de animais em propriedades com pastagens de boa qualidade nas mesmas regiões onde estão os imóveis com pastos degradados.
Na Amazônia, os pastos “nativos”, com lotação média de 0,11 cabeça por hectare, poderiam alcançar o padrão médio das pastagens plantadas no bioma, de 0,91 cabeça por hectare. No centro-sul do Cerrado, os pastos degradados, hoje com lotação média de 0,45 cabeça por hectare, poderia alcançar a média dos pastos plantados, de 1,08 cabeça por hectare.
Essa intensificação poderia ocorrer com a transposição de práticas que os vizinhos mais produtivos já adotam, como adoção de curvas de nível, terraceamento, adensamento de plantio de pastagem, calagem e adubação, diz Barbieri.
A transformação depende de políticas públicas, avaliam os pesquisadores. Eles defendem que o Programa ABC incorpore o crédito rural que hoje financia pastagens, mas que não se enquadra em nenhuma linha e, portanto, não garante aplicação de boas práticas. “Não estamos falando de mais dinheiro, mas usar recurso que está em linhas não eficientes”, diz Barbieri.
Os pesquisadores também defendem a adoção de crédito direcionado a regiões com mais problemas, já que hoje 1% dos municípios abriga 25% dos pastos considerados degradados pelos próprios proprietários. O pesquisador do WRI defende também que é preciso reforçar a assistência rural pública e diz acreditar que as novas políticas de carbono neutro dos frigoríficos possa auxiliar no apoio aos pecuaristas.
Fonte: Valor Econômico