Acordo em processos do glifosato deve sair em alguns meses
Ainda absorvendo o inesperado impacto bilionário da aquisição da Monsanto, a alemã Bayer está mais perto de deixar a pior fase para trás. Com um programa agressivo para reduzir despesas, o que incluirá demissões, e a intenção de se desfazer de ativos não estratégicos, a empresa confia que os problemas herdados da gigante americana de sementes e agrotóxicos serão solucionados ao longo do próximo ano.
À frente da divisão agrícola da Bayer, negócio que responde por mais de 45% do faturamento da multinacional, Liam Condon acredita que 2021 será um período de transição para o grupo, com um crescimento ainda lento. “A companhia está em meio a uma transformação, mas esperaria um crescimento significativamente mais forte nas três divisões [da empresa] em 2022”, disse o executivo ao Valor .
De janeiro a setembro, as vendas combinadas das três frentes de negócios da Bayer totalizaram € 31,4 bilhões, redução de 4,2% ante igual intervalo do ano passado. Além da frente agrícola, a empresa separa a operação em outras duas divisões: a farmacêutica, pela qual a Bayer é mais conhecida e que representa 40% do faturamento, e “Consumer Health”, que abrange produtos nutricionais, dermatológicos, para alergia e resfriados, dentre outros ( ver infográfico).
Para concluir a transição, a Bayer precisa encerrar pendências resultantes da enxurrada de processos judiciais movidos nos Estados Unidos acusando o Roundup, herbicida à base de glifosato, de provocar câncer. Embora siga defendendo a segurança do produto, o grupo alemão concordou em desembolsar até US$ 9,6 bilhões para encerrar os casos e virar a pagina nos EUA.
A resolução do contencioso é relevante para os acionistas da Bayer, que amargaram uma destruição de valor impressionante. Desde junho de 2018, quando a aquisição da Monsanto foi concluída, a empresa alemã perdeu € 41,3 bilhões em valor de mercado. As ações caíram 46,9% na bolsa de Frankfurt.
Ao Valor, Condon afirmou que a Bayer já firmou acordo com 70% dos litigantes. “Estamos trabalhando para encerrar os 30% restantes nos próximos meses”, enfatizou. A mediação do contencioso, que envolve cerca de 125 mil processos, está a cargo do especialista Kenneth Feinberg, advogado conhecido nos EUA por atuar nas indenizações às famílias das vítimas dos ataques de 11 de setembro e no vazamento de óleo no Golfo do México.
Paralelamente às negociações em curso para encerrar as ações existentes, a Bayer provisionou mais US$ 2 bilhões para ações futuras. Neste caso, um juiz da Califórnia é quem deve apreciar o proposta. A expectativa do chefe da área agrícola da companhia é que isso também levará alguns meses.
Desde que assumiu a Monsanto, em um negócio de números superlativos foram US$63 bilhões, a maior compra feita no exterior por uma empresa alemã, a Bayer adotou medidas para reduzir o endividamento, como a recente venda da divisão de saúde animal à americana Elanco, por US$ 7,6 bilhões. Graças a essa transação, a dívida líquida da Bayer diminuiu de €36 bilhões em junho para €28,3 bilhões em 30 de setembro.
No entanto, a companhia terá de fazer mais esforços. No terceiro trimestre, a divisãoagrícola foi a principal responsável pelo prejuízo de € 2,7 bilhões da Bayer no período.O grupo fez uma baixa contábil de mais de € 9 bilhões na divisão devido à menor taxade crescimento esperada e do efeito contábil gerado pelo maior custo de capital e adesvalorização do real.
Nesse contexto, a Bayer comunicou ao mercado em setembro um plano de corte adicional de gastos anuais de cerca de € 1,5 bilhão até 2024. Esse valor se soma aos€2,6 bilhões anuais previstos até 2022, conforme a companhia.
No processo, a Bayer fará demissões, reconheceu o chefe da divisão da agrícola. Mas ainda não há detalhes de como as economias adicionais serão divididas entre os diferentes negócios, o que só será anunciado no primeiro trimestre. Atualmente, a Bayer emprega mais de 100 mil pessoas. Na divisão agrícola, são aproximadamente 40mil.
À reportagem, Condon disse que o trabalho remoto provocado pela pandemiamostrou que várias atividades podem ser digitalizadas. “Ainda temos muitas posiçõesadministrativas e podemos acelerar a digitalização dos nossos negócios”, afirmou ele,ponderando que essa deve ser uma tônica em várias companhias do mundo. Atendência é que várias funções de rotina deixem de existir. Em contrapartida, outrasserão criadas, com ênfase em ciência de dados, indicou ele.
Além do corte de gastos, a venda de negócios não estratégicos, abaixo do “nível divisional”, está nos planos da Bayer. No começo de novembro, o Valor revelou que a Bayer colocou a fábrica Cancioneiro, em São Paulo, à venda. A unidade de hormônios femininos, como contraceptivos e pílulas de reposição hormonal, poderia ser avaliada entre R$ 300 milhões e R$ 350 milhões. Procurada pela reportagem na ocasião, a Bayer afirmou que “não comenta rumores”.
Fonte: Valor Econômico